Dança do Leão – Ritual
Durante o Ano novo chinês, dançarinos do leão de escolas de artes marciais costumam visitar lojas para fazer o “choy chang” (採青, literalmente “colhendo verduras”). O comerciante amarra um envelope vermelho contendo dinheiro numa cabeça de alface e pendura-a em frente à porta principal. O leão aborda então a alface como um gato curioso, “engole” a alface e cospe fora as folhas, mas não o dinheiro. Supõe-se que a dança do leão traga boa sorte e fortuna para o negócio, e os dançarinos recebem o dinheiro como recompensa (além deste aspecto lúdico, o “choy chang” era encarado como um pedido de protecção formal; ao aceitar o presente, a escola de Kung Fu cujos alunos realizavam a dança, comprometia-se a vir em socorro do comerciante caso seu estabelecimento fosse assaltado). A tradição tornava-se assim, uma transação mútua.
Outros tipos de “verduras” (青) podem também ser usados para desafiar o grupo quando, por exemplo, potes de abacaxis, toranjas, bananas, laranjas e pedaços de cana-de-açúcar são usados para criar pseudo-barreiras. A dança é também realizada noutras ocasiões importantes, incluindo festivais chineses, cerimónias de inauguração de negócios e casamentos tradicionais.
Hoje em dia, os negócios não exigem muito dos dançarinos, e este é um dinheiro fácil para as escolas de artes marciais. Nos dias de antanho, a alface era erguida entre 4,5 e 6 metros de altura e, somente artistas bem treinados em artes marciais, podiam alcançar o dinheiro enquanto dançavam com uma pesada cabeça de leão. Estes eventos tornaram-se um desafio público. Uma grande quantia de dinheiro era oferecida e a plateia esperava um bom espectáculo. Algumas vezes, se leões de várias escolas de artes marciais abordavam a alface ao mesmo tempo, imaginava-se que os leões deveriam lutar para decidir quem seria o vencedor.
Os leões tinham de lutar com refinados movimentos de leão, em vez dos estilos caóticos de luta de rua. A plateia então julgava a qualidade das escolas de artes marciais de acordo com a luta que os leões haviam travado. Dado que a reputação das escolas estava em jogo, as lutas eram geralmente ferozes, mas civilizadas. O leão vencedor usaria então métodos criativos e habilidades de artes marciais para alcançar a recompensa pendente nas alturas. Alguns leões podiam dançar sobre pernas de pau e alguns podiam formar pirâmides humanas compostas por seus colegas de escola. Os dançarinos e as escolas, quando se saíam bem, ganhavam elogios e respeito, para além da grande recompensa financeira.
Dança fora-da-lei
Durante os anos 1950-60, em Hong Kong, algumas pessoas que se juntavam aos grupos de dança do leão, tinham perfil de bandidos e havia muitas brigas entre grupos de dançarinos e escolas de Kung Fu. Os pais tinham medo que seus filhos se juntassem a grupos de dança do leão por causa da associação “criminosa” dos seus membros. Durante festivais e espectáculos, quando grupos de dança do leão se encontravam, havia lutas entre os grupos. Alguns truques acrobáticos eram utilizados para que o leão “lutasse” e nocauteasse outros leões rivais. Os participantes chegavam mesmo a esconder adagas em suas roupas e sapatos, as quais podiam ser usadas para ferir as pernas de outros dançarinos, ou mesmo colocavam um chifre de metal na testa do leão, o qual podia ser usado para golpear a cabeça de outros leões.
A violência chegou a tal ponto que o governo de Hong Kong teve de proibir completamente a dança do leão. Agora, como em muitos outros países, os grupos de dança do leão têm que obter uma autorização das autoridades, para poder realizar a dança. Embora ainda haja um certo grau de competitividade, os grupos tornaram-se bem menos violentos e agressivos. Hoje, a dança do leão é uma actividade muito mais voltada para o desporto e espectáculo, do que a representação de um determinado modo de vida.